Dr. Michael Laitman Para mudar o Mundo – Mude o Homem

CAPÍTULO 2: Quero, Logo Sou

Do livro “Como Um Feixe de Juncos”

A Vida como uma Evolução de Desejos

No capítulo anterior, dissemos que o nome, Ysrael (Israel), combina as palavras Yashar (direito) e   El  (Deus).  Estabelecemos  que  o  nome  surgiu quando Abraão reuniu pessoas que desejavam alcançar o Criador,  descobrir  Deus,  e  que  foram   chamadas   “Israel” segundo esse desejo. Neste capítulo discutiremos a formação dos desejos em geral, e a formação  do  desejo  pelo Criador, nomeadamente Israel, em particular. Para fazer isso, precisamos de examinar a realidade como uma evolução  de desejos.

Em 1937, Baal HaSulam publicou Talmude Êsser HaSefirot (O Estudo das Dez Sefirot), um comentário monumental sobre os escritos do ARI, autor de A Árvore   da Vida. No comentário, o autor entra em grande detalhe para explicar que na base da realidade reside o desejo de  dar, a que ele  chama “a  vontade de doar,” que então  criou a vontade de receber. Esta é a razão porque, explica Baal HaSulam, nossos sábios testemunham que “Ele é bom e faz o bem”41 e falam de “Seu desejo de fazer o bem às Suas criações”.42

Na Parte 1 de O Estudo das Dez Sefirot, Baal HaSulam explica porque a vontade de doar necessariamente criou a vontade de receber, e porque os dois desejos estão na base do todo da Criação. Nas suas palavras, “Assim que Ele contemplou a criação em prol de deleitar  Suas criaturas, esta Luz [prazer] imediatamente se prolongou e expandiu d’Ele na completa medida e forma dos prazeres que Ele havia contemplado. Tudo está incluído nesse pensamento, a que chamamos ‘O Pensamento da Criação’. …O Ari disse que no princípio, uma Luz superior e simples havia preenchido o todo da realidade. Isto significa que uma vez que o Criador contemplou deleitar as criações, e a Luz se expandiu e partiu d’Ele, o desejo de receber Seus Prazeres  foi imediatamente impresso nesta Luz”.43

Para sublinhar a suposição de que a vontade de doar, o Criador, criou a vontade de receber em prol de lhe dar prazer, Baal HaSulam categoriza essa seção, “A vontade de doar no Emanador necessariamente gera a vontade de receber no emanado, e ela [a vontade de receber] é o vaso  na qual o emanado recebe Sua Abundância”.44

Ashlag não foi o primeiro a se referir à criação da vontade de receber pela vontade de doar, por isso ele o fez mais implicitamente. Rabi Isaiah HaLevi Horowitz (O Sagrado Shlah) também escreveu que “Uma vez que Ele favoreceu fazer o bem às Suas criações, Ele as desejou beneficiar com o verdadeiro benefício, como com a matéria da criação da inclinação do mal [desejo de receber, egoísmo], que é a favor das criações”.45

Semelhante aos dois mencionados acima os sábios,  Rabi Nathan Sternhertz escreve em Likutey Halachot  [Regras Sortidas], “O Senhor aumenta Suas misericórdias e gentileza, pois Ele desejou beneficiar Suas criações no melhor possível de todo o melhor”.46

Assim, a vontade de doar, o Criador, deseja doar sobre nós, Suas criações, e é suposto recebermos esse benefício, a doação. Todavia, o que é esse benefício, o bem que é  suposto recebermos?

Na sua “Introdução ao Estudo das Dez Sefirot”, Baal HaSulam escreve que o benefício que é suposto recebermos é alcançar o Criador, tal como Abraão fez há praticamente 4000 anos atrás. Nas palavras de Ashlag, “[quando alcançamos] sente -se o maravilhoso benefício contido no Pensamento da Criação, que é deleitar Suas criaturas com Sua mão completamente bondosa e generosa. Devido à abundância do benefício que se alcança, amor maravilhoso aparece entre uma pessoa e o Criador, incessantemente derramando sobre ela pelos próprios trilhos e  canais  através dos quais o amor natural aparece. Contudo, tudo isto chega a uma pessoa a partir do momento em que ela alcança e daí em diante.”47

Para alcançar o Criador, temos de ter qualidades semelhantes às Suas, ou nos termos de Baal HaSulam,  temos de obter “equivalência de forma” com Ele. Na “Introdução ao Livro, Panim Meirot uMasbirot [Face Brilhante e Acolhedora] “, Ashlag escreve, “Assim, como pode-se alcançar a Luz … quando se está separado e em completa oposição de forma … e há grande ódio entre eles [Criador e pessoa]? …Desta forma, a pessoa … lentamente purifica e inverte a forma de recepção para ser em prol de doar. Você descobrirá que a pessoa equaliza  sua  forma  com  o  sistema  de santidade, e a equivalência e amor entre eles regressa … Assim, se é recompensado com  a  Luz  … uma vez que se entrou na presença do Criador.”48

 

QUATRO NÍVEIS DE DESEJO MOLDAM A REALIDADE

Quando examinando a realidade da perspectiva  da  evolução de desejos, os Cabalistas descobriram que a vontade de receber que acabamos de descrever contém quatro níveis distintos, imóvel (inanimado), vegetativo (flora), animado (fauna), e falante (humano). Desde que o ARI mencionou a divisão da realidade nesses quatro níveis no século XVI,49 numerosos acadêmicos e Cabalistas discutiram esses quatro níveis. O MALBIM (Meir Leibush ben Iehiel Michel Weiser),50 Rabi Pinhas  HaLevi  Horovitz,51 e o RABaD (Rabi Avraham Ben David), que escreveram, “Todas as criaturas do mundo são imóveis, vegetativas, animadas e falantes”,52 são senão três de numerosos sábios que se referem à realidade como consistindo desses quatro  níveis.

Todavia, nenhum sábio ou acadêmico é tão descritivo como Baal HaSulam. Seus escritos, que explicitamente pretendeu que todos lessem e compreendessem, sistemática  e elaboradamente detalham a estrutura da realidade da maneira que os Cabalistas e acadêmicos Judeus a percebiam durante  as eras.   Em seu ensaio, “A Liberdade”,   ele explica a estrutura dos desejos imóvel, vegetativo, animado e falante sob a seção, “Lei da Causalidade”. Ele explica que todos os elementos da realidade estão ligados e emergem uns dos outros. Nas suas palavras, “É verdade que há uma ligação geral entre todos os elementos da realidade perante nós, que se regem pela lei da causalidade, por meio de causa e efeito, avançando em frente. E como o todo, assim cada item em   si mesmo, ou seja que toda e cada criatura no mundo dos quatro tipos, imóvel, vegetativo, animado e falante, se rege pela lei da causalidade por meio de causa e efeito.

“Além do mais, cada forma particular de um comportamento particular, que uma criatura segue enquanto neste mundo, é empurrada por causas antigas, a obrigando a aceitar mudança nesse comportamento e não outro que se pareça. Isto é aparente a todos aqueles que examinam os caminhos da Natureza de um ponto de vista puramente cientifico e sem uma migalha de influência. Certamente, devemos analisar esta matéria para nos permitirmos a nós mesmos examiná -la de todos os lados.”53

OS QUATRO NÍVEIS DENTRO DE NÓS

Mas há mais, nossos sábios afirmam, os níveis de imóvel, vegetativo e falante não são exclusivos à natureza externa. Eles existem dentro de todo e cada um de nós, formando a base dos nossos desejos e até da estrutura interior de cada desejo. Rabi Nathan Neta Shapiro escreve, “Há quatro  forças no homem, inanimado, vegetativo, animado e  falante, e Israel têm ainda outra, quinta parte, pois eles são  o Divino falante.”54

Baal HaSulam fornece uma explicação mais elaborada da maneira como e stes níveis de  desejos  funcionam  dentro de nós: “Nós distinguimos quatro divisões  na espécie falante [humanos], ordenadas em gradações uma sobre a outra. Essas são as Massas, os Fortes, os Ricos, e os Sagazes. Elas são iguais aos quatro graus no todo da realidade, chamados ‘Inanimado’, ‘Vegetativo’, ‘Animado’,   e ‘Falante’.

“O inanimado … suscita as três propriedades, vegetativo, animado, e falante. … A mais pequena força entre elas é a vegetativa. A flora opera ao atrair o que é benéfico para ela e rejeitando o prejudicial muito  da  mesma maneira que os humanos e a nimais. Contudo, não há sensação individual nela, mas uma força  coletiva, comum a todas as plantas no mundo…

“Sobre elas está o animado. Cada criatura sente a si mesma, atraindo o que é benéfico a ela e rejeitando o prejudicial. …Esta força sensível no Animado é muito limitada em tempo e espaço, uma vez que a sensação não opera sequer a mais curta distância fora de seu corpo. Também, ele não sente nada fora de sua própria estrutura temporal, ou seja no passado ou no futuro, mas somente   no  presente momento.

“Acima delas está o falante, consistindo de uma força emocional e uma força intelectual juntas. Por  esta razão,  seu  poder  em atrair  o que  é bom  para  ele e rejeitar   o que é prejudicial e ilimitado no tempo e lugar, como é no animado. Devido à ciência, que é  uma  faculdade intelectual, ilimitada pelo tempo e lugar, se consegue  ensinar a outros onde quer que eles estejam no todo da realidade, no passado ou no futuro, e no decorrer das gerações.”55

ONDE  NÓS  SOMOS  LIVRES  PARA ESCOLHER

Tal como aprendemos de Baal HaSulam, a diferença entre   o nível falante da realidade e os outros  três níveis,   tanto   na sua natureza geral e dentro de nós, é que nós somos ilimitados em tempo e lugar enquanto escolhendo o que aproximar a nós e o que repelir. Colocando-o diferentemente,  no  todo  da  Natureza,  a  raça  humana  é a única espécie que tem liberdade de  escolha.  Enquanto todas  as  outras  criaturas  seguem  as   ordens   da   Natureza involuntariamente, nós podemos escolher se as seguimos ou não. Lamentavelmente, como é evidenciado pelas crises globais de hoje, quando escolhemos ir contra    as ordens da Natureza sem completo conhecimento das implicações de nossas ações,  sofremos  duras  consequências pelos nossos  erros.

E uma vez que interiormente consistimos dos mesmos quatro níveis, a mesma regra se aplica dentro de nós, e somente aqueles desejos e qualidades dentro de nós que pertencem ao nível falante são aquelas nas quais temos liberdade  de escolha.

Dentro de nós, os desejos básicos naturais, para reprodução e continuação da espécie, por abrigo e por alimentação, correspondem aos primeiros três níveis de desejos na Natureza, inanimado, vegetativo, e animado. O quarto nível, “falante,” manifesta dentro  de  nós  desejos  por prosperidade além das nossas necessidades, poder,  fama, respeito e conhecimento. A diferença fundamental entre os três níveis inferiores e o do topo é que os três inferiores existem em cada criatura na terra. Cada criatura procura assegurar a existência da sua própria espécie e manter  sua  descendência  a  salvo  num  abrigo   adequado.

Inversamente,  o  quarto  nível  de  desejos,  que definiremos rudemente como “desejos por riqueza, honra e conhecimento,” são exclusivamente humanos.

Tal como na sua natureza geral, os três níveis inferiores funcionam automaticamente, de acordo com as ordens da Natureza. A única faculdade na qual há liberdade de escolha é o nível falante de desejos. Desta forma, devemos primeiro aprender os funcionamentos da nossa natureza interior antes que tentemos satisfazer os desejos do nível superior.

Para sermos capazes de trabalhar com o quarto nível de desejos, precisamos de saber o que afeta esses desejos e o propósito de sua existência dentro de nós. Com efeito, há outro nível de desejos dentro de nós que “suplanta” todos   os quatro níveis, e que existe somente nos humanos.

 

O PONTO NO CORAÇÃO

Este é o nível a que Rabi Nathan Shapiro chamou, “o  Divino falante”. Ele é este desejo que nos propulsiona a explorar como este mundo funciona, o que o faz funcionar  e como ele o faz, e porquê. Ele é o desejo a que chamamos “Israel”, Yashar El (direito ao Criador). Em Abraão, esse desejo apareceu como o anseio de saber “Como era possível que esta roda sempre rodasse sem um condutor? Quem a roda, pois ela não se pode rodar a si mesma?”56

Baal HaSulam chamou a esse desejo de conhecer o Criador, “o ponto no coração”. Na sua “Introdução de O Livro do Zohar”, ele explica que o coração pode ser visto como o todo dos nossos desejos, e que “o ponto  no  coração” é o desejo dentro de nós que aponta para o Criador.57    Meu  professor,  o  Rav  Baruch  Shalom  HaLevi Ashlag (o Rabash), o filho primogênito de Baal HaSulam e seu sucessor, explicou que o “ponto no coração” é o desejo chamado  “Israel”.  Nas  suas  palavras,  “Há  também  Israel numa pessoa … mas ela é chamada ‘um ponto no  coração’.”58

Agora podemos ver porque Abraão estava tão determinado    a  partilhar  o  que  ele  havia  descoberto. Ele sabia que os desejos humanos estavam evoluindo, e ele  sabia que quanto mais eles evoluem, mais eles se voltarão para adquirir prosperidade, poder, dominação sobre os outros e conhecimento. Era claro para ele que sem adquirir o conhecimento da natureza dos desejos humanos, as pessoas não seriam capazes de se gerir a si mesmas e suas sociedades adequadamente.

Assim que Nimrod teve sucesso em impedir os  esforços de Abraão de circular seu conhecimento aos Babilônios, esse homem sábio juntou aqueles que o seguiam e saiu da Babilônia para espalhar sua  mensagem  no exterior. Certamente, o legado de Abraão para nós é que aqueles que compreenderam o que ele havia ensinado deviam partilhar o conhecimento com quem quer que estivesse disposto a escutar. Nas palavras de O Livro do Zohar, “Abraão cavou esse poço [Beer Sheba]. Ele descobriu-o porque ele havia ensinado a todas as pessoas  no mundo a servir o Criador. E assim que ele o cavou, ele emite águas vivas que nunca cessam.”59

O povo de Israel de hoje são os descendentes dos estudantes de Abraão, pessoas com pontos nos seus corações, o ponto de Israel dentro delas. E embora esse ponto agora esteja enterrado por baixo de séculos de esquecimento, ele existe e aguarda ser reacendido. Nas palavras do Sagrado Shlah, “Israel são chamados a ‘Assembleia  de  Israel’,  pois  embora  abaixo  eles  estejam separados uns dos outros, todavia, acima, na raiz de suas almas, eles são uma unidade, e estão congregados, pois são   a parte do Senhor. Os ramos [o povo de Israel] que desejam regressar a suas raízes devem seguir o exemplo de suas raízes,   ou   seja   se   unirem   abaixo   também.   Quando  a separação está entre eles, aparentemente causam separação  e divisão acima, vejam quão longe a questão se prolonga. Desta forma, o todo da casa de Israel deve perseguir a paz e ser um, em paz e completude, sem um defeito, para se assemelhar a seu Fazedor [estarem em equivalência de forma com Ele], pois assim é o nome do Senhor, ‘Paz’.”60

Assim que Israel se una e assim se corrigirá, a si mesmos, eles podem concretizar sua vocação e  serem  “Uma luz para as nações” (Isaías 42:6). Nas  palavras  de Rabi Naftali Tzvi Yehuda Berlin (O NATZIV de Volojin),  “A principal razão pela qual maioria de nós vive em exílio    é que o Senhor divulgou a Abraão Nosso Pai  que  seus  filhos foram feitos para serem uma luz para as nações, que   é impossível a menos que estejam dispersos no  exílio.  Assim foi Jacó, Nosso Pai, quando ele chegou ao  Egito, onde a maioria do povo estava. Com isso, Seu nome se tornou grande, quando eles viram Sua providência sobre Jacó e seus  descendentes.”61

Falando da evolução dos desejos, a raça humana constitui o quarto e mais alto nível de desejo, o único que permite o livre arbítrio. Mas para tomar as escolhas certas, as pessoas precisam saber como tudo funciona a partir da sua raiz. O povo Israelita re presenta  o desejo de conhecer   a raiz, e desta forma é sua responsabilidade estudar a raiz,    e transmitir seus discernimentos e percepções ao resto da humanidade. Assim, todos saberão como fazer com  que suas escolhas funcionem para seu benefício.

Para obter esse conhecimento, Abraão formou um método de estudo que os sábios durante as eras   nutriram    e desenvolveram. O próximo capítulo descreverá  a  evolução desse método, que desde que foi escrito O Livro  do Zohar, tem sido referido como “Cabalá”.

 

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