Dr. Michael Laitman Para mudar o Mundo – Mude o Homem

Conexão: Uma Coisa Nova no Menu do Séder

 

Este ano, enquanto nos sentamos à volta da mesa durante o Séder e falarmos sobre liberdade, vamos falar sobre liberdade do ódio.

Quando mais fundo entramos em 2017, mais caótico parece o mundo. Hoje, a única coisa com que a maioria das pessoas consegue concordar é que o trem da sociedade humana se está a descarrilar e o banco de maquinista está vazio. Donald Trump luta para colocar sua administração em movimento contra os fieis do governo anterior nos media e no sistema judicial. Até no seu próprio partido, Trump está a lutar contra o criticismo que soa ter saído directamente de um discurso de Bernie Sanders. Na Europa, o Reino Unido iniciou o processo do Brexit, ninguém está certo dos resultados da separação, nem alguém está certo da desejada direcção para a UE.

Foto: Desconhecido, Licença: N/A2017-04-05

Uma Mesa do Séder de Pêssach Foto: Desconhecido

Hoje, a maioria dos líderes da União Europeia e eurodeputados concordam que o bloco perdeu o caminho. Figuras líderes tais como Gianni Pittella afirmam, “Precisamos de uma nova direcção para a Europa que aponte para um forte pilar social.” Similarmente, Rosa D’Amato disse, “Há a UE dos bancos, grandes empresas e lobbies e a UE dos cidadãos, aqueles que perderam seus empregos que não têm direitos.”

Parece que a tendência principal na arena política é “cada país por si mesmo.” Com o Brexit a caminho, a política de Trump é “América primeiro,” Marine Le Pen na França e a AfD na Alemanha estão a ganhar apoio e a maioria dos Suecos apoiam um Swexit. Todavia, se a UE se desmoronar e cada país tiver de se defender a si mesmo, quem será o adulto responsável a acalmar as coisas quando os conflitos surgirem? Em tal estado, a distância entre uma disputa relativamente menor e toda uma guerra pode ser uma questão de dias.

Natureza Versus Natureza Humana

O laureado Prémio Nobel da física Dennis Gabor escreveu em 1964: “Até agora o homem tem estado contra a Natureza, daqui em diante ele estará contra sua própria natureza.” Certamente, durante várias décadas temos sido tecnologicamente capazes de abastecer todo o ser humano com toda a necessidade básica em prol de se sustentar. Se quiséssemos, podíamos fornecer a todos comida fresca e água, sanação adequada, electricidade, comunicações e educação.

O problema é que não temos desejo de fazer isso. Nosso ódio de uns pelos outros está a fazer com que a era mais avançada tecnologicamente produza a fome mais amplamente espalhada desde a Segunda Guerra Mundial, que em si foi a apresentação mais satânica de ódio humano.

Tudo ao nosso redor, incluindo nossos próprios corpos, são o resultado de diferentes forças, frequentemente conflituosas, órgãos e vectores que se complementam uns aos outros para criar o universo em que vivemos e do qual fazemos parte. Cada parte na teia que é o nosso mundo contribui sua quota para a estabilidade e prosperidade do sistema que é nosso mundo. Além do mais, quanto mais alto na cadeia evolucionária subirmos, mais complexo é o sistema de interligação e interdependência que encontramos, exigindo um nível mais alto de comunicação e conexão entre as partes.

Todavia, nós humanos somos completamente opostos à natureza. Nós procuramos nos separar de tudo como se não fossemos dependentes do mundo ao nosso redor. Em todos os níveis da existência humana, procuramos criar “Brexits.” Até nossa saúde é afectada pela nossa antipatia recíproca. Numa entrevista para o Canal 2 de Israel, Thomas Friedman do The New York Times disse que perguntou ao Cirurgião Geral Vivek Murthy, “Qual é a doença mais prevalecente na América, é câncer, diabetes, doença cardíaca? Ele disse, ‘Nenhuma dessas, é isolamento!'”

Sucede-se que nossa alienação de uns dos outros está a causar nossas crises pessoais, sociais e globais ao tentarmos ir contra a natureza conectada da realidade. De facto, essa tensão entre nosso isolacionismo e narcisismo versus a conectividade da realidade tornou-se tão intensa que em toda a semelhança, ela já deveria ter estalado. Nós vemos a onda global de terrorismo como uma tragédia, mas apesar de todas suas trágicas consequências, o terrorismo é um modo de permitir que o ódio étnico e religioso se exprima de maneiras menos injuriosas que numa guerra completa. Todavia, claramente, este tipo de “válvula para o alívio da pressão” é insuportável e a menos que nos apressemos a descomprimir esta bomba relógio, ela vai explodir numa guerra total.

Quanto mais nos desenvolvemos, mais conectados e interdependentes nos tornamos. Ironicamente, nosso narcisismo está a impulsionar a globalização ainda mais rápido pois ele nos faz querer explorar todos para nosso benefício pessoal e portanto nos obriga a conectar às outras pessoas ainda mais estreitamente que no passado em prol de as usarmos. Porém, dado que nosso narcisismo também cresce, nossa conexão forçada está a tornar-se tão dolorosa que estamos a perder a capacidade de nos conectarmos uns aos outros adequadamente. Ora evitamos a conexão por completo através do suicídio ou abuso de substâncias, ou atacamos-a por ser abusiva, agressiva e por vezes até homicida.

Os Brexits que cozinham por todo o mundo são ajustamentos necessários para acalmar a pressão de nossa conexão forçada. Romano Prodi, o ex-Primeiro Ministro italiano, concluiu correctamente que “A UE não tem estratégias e não há líder para seguir. A Europa com que sonhei está morta.” Ele também está correcto ao dizer, “quem quer que conduza uma coligação política e grupo de países deve considerar os interesses de todos os membros.” Uma vez que esta consideração claramente não é a situação na UE, ela deve ser desmontada antes que nos expluda em pedaços.

Mutuamente Responsáveis

Apesar da necessidade de separação temporária, no final teremos de nos juntar ao curso da natureza e nos conectar. Conexão adequada será o próximo grande desafio da humanidade. Nossa “fronteira final” não é o espaço, como pensávamos nos anos 60. Nossa fronteira final são nossas conexões com as pessoas com quem vivemos. Nossas conexões com as pessoas que nos rodeiam e as conexões entre as sociedades e países vão determinar o destino da humanidade.

O primeiro passo para construir uma sociedade sustentável é entender que quer queiramos quer não, há responsabilidade mútua entre nós. Nos anos 30, o maior comentador do Livro do Zohar, Rav Yehuda Ashlag, escreveu um ensaio intitulado “Paz no Mundo” onde ele observava que todos somos interdependentes. Nas suas palavras: “Não podemos mais falar ou lidar com justas condutas que garantem o bem-estar de um país ou de uma nação, mas somente com o bem-estar do mundo inteiro pois o benefício ou dano de toda e cada pessoa no mundo depende e é medido pelo benefício de todas as pessoas no mundo.” Aquilo que era verdade nos anos 30 é tanto quanto o mais hoje, mas ainda estamos para chegar a um acordo com o facto de que a dependência mútua implica responsabilidade mútua.

De facto, o judaísmo é edificado sobre educar as pessoas para a conexão. Agora que nos aproximamos de Pêssach, é um bom tempo para nos relembrarmos que fomos declarados uma nação somente após concordarmos em nos unir “como um homem com um coração.”

Durante nossos anos de formação enquanto nação, procuramos aumentar nossa conexão sobre o ódio que irrompia entre nós. Transformamos conexão acima do ódio numa ideologia que sobreviveu durante as gerações. Disse o Rei Salomão, “Ódio incita ao conflito e o amor cobre todos os crimes” (Prov. 10:12). Similarmente, o livro Likutey Etzot (Conselhos Sortidos) diz, “A essência da paz não é conectar dois opostos. Assim, não fique alarmado se vir uma pessoa cuja visão é o completo oposto da sua e pensar que nunca será capaz de fazer a paz com ela. Também, quando vir duas pessoas que são completamente opostas uma da outra, não diga que é impossível fazer a paz entre elas. Pelo contrário, a essência da paz é tentar fazer a paz entre dois opostos.” Adicionalmente, o livro Cartas do Raiah declara que “A grande regra sobre a guerra das visões, quando cada visão vem para contradizer outra, é que não precisamos de contradizê-la, mas em vez disso construir sobre ela e portanto ascender.” Finalmente, recentemente no ano passado, Andrés Spokoiny, presidente e CEO da Jewish Funders Network disse, “Respeito e desacordo historicamente foram uma grande parte de quem nós somos. Nós somos um povo que acredita que o desacordo é um caminho para refinarmos nosso compasso moral. Nós somos um povo que ensinou ao mundo a abraçar a diversidade e celebrar a diferença.”

Na Linha da Frente da Conexão

Recentemente, tal como Sr. Spokoiny também salientou durante o seu discurso, nós vimos “uma polarização sem precedentes e feiura na comunidade judaica. Aqueles que pensam diferente são considerados inimigos e traidores e aqueles que discordam de nós são demonizados.”

Assim que entendermos que nosso problema é nossa separação e ódio recíproco, devemos procurar o oposto. Quando os judeus se uniram no pé do Monte Sinai, nos foi imediatamente dada a tarefa de dar um exemplo de união para que o mundo se pudesse unir, também. Por outras palavras, nos foi ordenado para sermos “uma luz para as nações.” Não sabíamos como, mas estavamos dispostos a tentar. Isto é tudo o que é hoje exigido de nós.

Similarmente, no ensaio que anteriormente mencionei, “Paz no mundo,” Rav Ashlag escreve que não sabemos como nos conectarmos até tentarmos. Nas suas palavras, “Tal é a conduta do desenvolvimento na natureza – a acção vem antes do entendimento e somente acções vão provar e empurrar a humanidade para a frente.”

Nós judeus estamos na linha da frente da ciência, tecnologia e finanças. Todavia, aquilo que o mundo precisa é que estejamos na linha da frente da conexão. Tal como disse Sr. Spokoiny, “O colapso da civilidade não é apenas um problema judeu. Nós como judeus somos como todos os outros, só um pouco mais assim.” Todavia, nós enquanto judeus somos os únicos de quem é esperado ser um modelo exemplar de união e civilidade e não um exemplo do oposto. A severidade com a qual a ONU julga Israel em comparação com todos os outros países no mundo combinados não é uma mera expressão de antissemitismo. Por baixo do ódio reside a expectativa de que os Judeus sejam “uma luz para as nações,” ou seja que conduzam o mundo na direcção oposta – do ódio para o amor. Quando essa expectativa encontra a dura realidade da nossa separação, ela resulta na raiva contra nós, que então se transforma em ódio. Nós chamamos a isto antissemitismo. O que o inflama não é se somos globalistas de esquerda ou isolacionistas conservadores de linha dura. Em vez disso, seu combustível é nosso tratamento de nossos correlegionários, independentemente das suas visões políticas ou económicas.

Nós devemos usar cada oportunidade à nossa disposição para tentar inverter a tendência para o isolamento. Na próxima semana, enquanto nos sentarmos à volta da mesa durante o Séder e falarmos de liberdade, vamos falar da liberdade do ódio. Vamos realmente pensar sobre o que significa sermos “uma luz para as nações” e por que há antissemitismo. Se o fizermos, esta pode muito bem ser a nossa mais significativa e memorável noite de Pêssach de sempre!

No mês passado o presidente da UE Antonio Tajani declarou ante o Parlamento Europeu: “Hoje mais que nunca precisamos de mostrar que estes desafios podem somente ser superados se estivermos unidos.” Todos entendem que a união é imperativa, mas somente nossa nação tem a chave oculta para fazer o amor cobrir todos os crimes, como Rei Salomão exprimiu. Se “a acção vem antes do entendimento,” como escreveu Ashlag, então vamos agir em união e veremos o que ela produz. O que quer que aconteça, se nos direccionarmos para a união, não nos podemos enganar.

Publicado originalmente no Haaretz 

 

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